sexta-feira, 22 de outubro de 2010

A luta pela borracha no Brasil

Trecho do livro "A luta pela borracha no Brasil: um estudo de história ecológica", de Warren Dean.




Em outubro de 1936 James R. Weir (especialista responsável pelos cuidados nas plantações) visitou os seringais da Goodyear na América Central a fim de selecionar clones que levaria para Belterra. Possivelmente para dar o troco à descortesia precedente de Bangham, fez um relatório pessimista sobre a escolha do terreno e os métodos de plantio da Goodyear. Acreditava que o mal-das-folhas estava presente havia muito tempo, introduzido num pequeno seringal de trinta anos que a Goodyear também comprara e provavelmente propagado pelo próprio pessoal da plantação. Sua opinião desfavorável sobre as perspectivas da Goodyear foi reafirmada três anos depois por C.A. Pringle, um dos assistentes de Townsend, que informou que as práticas de cultivo e a qualidade da mão-de-obra eram superiores em Belterra.

O capital brasileiro não aproveitou a brecha aberta pelos relutantes capitalistas estrangeiros. A formação do segundo cartel internacional da borracha provocou menos resposta do que o primeiro. Na Bahia talvez outras 100.000 árvores tenham sido plantadas no fim da década de 20 e em São Paulo o Instituto Estadual de Agronomia empreendeu uma plantação experimental na costa de Ubatuba. No Amazonas só havia duas outras plantações importantes durante os anos 30: uma de 115.000 árvores em Parintins, iniciada em 1931 por colonos japoneses, e um trato menor, perto de Manaus, que começou a ser plantado em 1935 por Cosme Ferreira Filho, conhecido partidário da heveicultura. Nenhum desses seringais recebeu tratamento adequado. Era patente que os brasileiros não confiavam muito no futuro da seringueira, plantada ou nativa, no país, inclusive num mercado mundial artificialmente suportado.

A demanda brasileira de borracha era bastante pequena e não aumentou durante os anos 30. Um estudo feito para o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio calculou que as importações de artefatos de borracha sob todas as formas, caiu de 8.891 toneladas em 1929 para 6.343 em 1937, enquanto as indústrias brasileiras do setor, já incluindo algumas pequenas fábricas de pneus e câmaras-de-ar em Belém, Rio de Janeiro e São Paulo, aumentaram seu consumo de apenas 544 para 2.759 toneladas durante o mesmo período. Por volta de 1940 a Pirelli, a Firestone e a Goodyear abriram fábricas em São Paulo, e uma firma brasileira do Rio de Janeiro, com assistência técnica da Seiberling (americana), também expandiu sua produção. Juntas, quase dobraram o consumo interno de borracha bruta.

O governo Vargas, com fortes tendências para políticas econômicas autárquicas, favoreceu o desenvolvimento de tal indústria e estava atento à necessidade de satisfazer a maior demanda de matérias-primas que disso resultaria. O comando militar previu uma maior demanda de pneus, caso o Brasil fosse levado à guerra. Sem embargo, eles não sentiam maior urgência em passar da borracha de seringais nativos à borracha de cultivo. Subsistia a crença factível intensificar a extração na selva. Citava com frequência a estimativa de Paul e Cointe de trezentos milhões de árvores para demonstrar que podiam ser obtidas 60.000 ou até 100.000 toneladas de borracha extrativa caso se pudesse conseguir transporte para os trabalhadores do Nordeste. Realizou-se um debate no Conselho Federal do Comércio Exterior, o organismo de planejamento central de Vargas, acerca da viabilidade da criação de um instituto nacional da borracha. Institutos desse tipo - na verdade, cartéis - haviam sido criados para o café, açúcar e álcool, pinho e cacau. O plano foi combatido e no fim derrotado pelos detentores dos interesses do comércio extrativo da Amazônia, que pareciam temer a intervenção governamental, ainda que o propósito desta fosse, antes de mais nada, aumentar os preços domésticos. Tais pessoas também podem ter suspeitado que o instituto promoveria o desenvolvimento de plantações competitivas.

Assim, os seringais da Ford permaneceram como o único intento significativo de cultivo da seringueira no Brasil. Representaram uma experiência em vasta escala, custosa, eivada de erros e de resultado incerto. Os brasileiros sabiam apenas vagamente da luta que lá ocorrera e da sucessão de tentativas que já haviam sido levadas a cabo, a fim de determinar a praticabilidade do plantio competitivo e em grande escala da seringueira em presença de um parasita virulento e aparentemente invencível. As condições de mercado do período entre guerras foram extremamente desalentadoras, restringindo o investimento e toldando as perspectivas de desenvolvimento a longo prazo. Mas novas forças econômicas emergiam, embora o Brasil estivesse envolvido no conflito mundial. Ainda mais recursos eram canalizados para a Amazônia, a fim de preservar os seringais da Ford e intensificar de maneira substancial a busca de soluções para o problema do mal-das-folhas. (pág. 128-130)

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